Mercados Financeiros V – Seguro, Capitalização e Previdência Aberta
A Investigação Financeira é metodologia aplicável à atividade de persecução estatal de crimes que geram produto e proveito (1) e o investigador financeiro precisa de familiaridade com o locus por onde transitam a maior parte dos lucros dos crimes e estão depositados os principais dados que guiarão a atividade de persecução estatal: os mercados financeiros. Em postagem anterior, tratou-se da estrutura do Sistema Financeiro Nacional – SFN, o subsistema normativo de regulação e fiscalização e o subsistema operativo (2).
Já foram abordados os mercados de crédito (3), câmbio (4) e capitais (5). Agora passemos ao mercado de seguros privados, capitalização e previdência aberta.
No Brasil existe uma unidade normativa e fiscalizatória em torno do mercado formado pela junção dos contratos de seguros privados, dos contratos de capitalização e dos contratos da previdência complementar aberta. Tal mercado unificado é regulamentado pelo Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP e fiscalizado pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP (2).
Seguros Privados
Os contratos de seguro no Brasil estão regulados, em termos gerais, no Código Civil (arts. 757 a 802) e no Decreto-Lei 73/66. Modalidades especiais de seguro estão disciplinadas em leis especiais, tais como o seguro de assistência à saúde (Lei 9.656/98) e o seguro obrigatório de danos por embarcações (Lei 8.374/91).
Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou coisa, contra riscos predeterminados (art. 757, CC). O Decreto-Lei n. 73/66 se propõe a disciplinar os contratos de seguro de coisas, pessoas, bens, responsabilidades, obrigações, direitos e garantias (art. 3º). É objeto do contrato de seguro, pois, algum interesse segurável, configurado como bem (seguro de dano, art. 778 e ss, CC) ou pessoa (seguro de pessoa, art. 789 e ss., CC). Busca-se proteger o interesse segurável de acontecimento futuro e incerto previsto na apólice ou bilhete de seguro (risco predeterminado, art. 760, CC). Se o risco ocorrer, diz-se que ocorreu o sinistro.
O Decreto-Lei n. 73/66 traz normas de direito público incidentes sobre contratos de seguro (arts. 9º a 14) que restringem a liberdade de contratação prevista no Código Civil. Ademais, a decreto-lei institui a obrigatoriedade de contratação de seguros para vários ramos da atividade econômica reputados sensíveis (art. 20) (6).
Somente pode ser segurador a entidade entidade para tal fim autorizada (art. 757, parágrafo único, CC). Justamente para regulamentar as atividades do segurador, no interesse dos segurados e beneficiários, o Decreto-Lei n. 73/66 criou o Sistema Nacional de Seguros Privados composto pelo órgão normatizador do mercado (CNSP), pelo órgão fiscalizador (SUSEP) e por resseguradores, sociedades seguradoras e corretores habilitados (art. 8º).
O papel de segurador é desempenhado no Sistema Nacional de Seguros Privados por sociedades seguradoras, empresas constituídas sob a forma de sociedade anônima (art. 72, parágrafo único, Decreto-Lei n. 73/66) que não podem explorar nenhuma outro ramo do comércio ou da indústria (art. 73). Além do mais, sociedades seguradoras só poderão operar em seguros para os quais tenham autorização, segundo planos, tarifas e normas aprovadas pelo CNSP (art. 78). A autorização para funcionamento das sociedades seguradoras depende de autorização do Ministro de Estado, após apreciação do CNSP e da SUSEP (art. 74 a 77) (7).
Também fazem parte do mercado de seguros privados os contratos de cosseguro, resseguro e retrocessão (art. 4º, Decreto-Lei n. 73/66).
A política de resseguro e retrocessão, as operações de cosseguro, as contratações de seguro no exterior e as operações em moeda estrangeira do setor securitário, foram disciplinadas pela Lei Complementar n. 126/2007. Por cosseguro se entender a modalidade de seguro múltiplo que ocorre quando a cobertura é repartida entre uma pluralidade de seguradores que dão cobertura simultânea ao mesmo risco de dano, normalmente envolvendo grandes quantias. Quando o risco for assumido em cosseguro, a apólice indicará o segurador que administrará o contrato e representará os demais (art. 761, CC).
O resseguro, por sua vez, consiste na transferência de parte ou de toda a responsabilidade do segurador para o ressegurador (seguro do seguro). No resseguro, a relação contratual entre seguradora e resseguradora é estranha ao segurado, que permanece vinculado ao contrato original. Retrocessão (ou retrosseguro), por fim, é a operação pela qual o ressegurador coloca seus excedentes junto a outros seguradores, contratando novo resseguro. Aplicam-se aos estabelecimentos autorizados a operar em resseguro e retrocessão, no que couber, as regras estabelecidas para as sociedades seguradoras.
Capitalização
As atividades de capitalização são reguladas pelo Decreto-Lei n. 261/67, que criou o Sistema Nacional de Capitalização, formado por CNSP, SUSEP e sociedades de capitalização.
Os contratos de capitalização, também conhecidos como “títulos de capitalização”, prevêem a constituição de capital mínimo, perfeitamente delimitado em cada plano e pago em moeda corrente em um prazo máximo indicado no mesmo plano. Eles são operados por sociedades de capitalização, constituídas sob a forma de sociedade anônimas e submetidas a inúmeras regras comuns às sociedades seguradoras do Decreto-Lei 73/66 com o objetivo de preservar os interesses dos consumidores.
Previdência Complementar Aberta
A última espécie de contrato que compõe mercado financeiro em questão é o contrato de previdência complementar aberta.
A previdência social foi instituída no Brasil a partir da Lei 4.682/23 (Lei Elói Chaves) sob a forma de regime de previdência pública, instituído pelos entes federativos para seus servidores; e sob a forma de regime de previdência privada. Posteriormente, a Lei 6.435/77 criou as entidades de previdência privada em entidades fechadas e entidades abertas.
Atualmente, a partir das normas da Constituição Federal de 1988 (arts. 201 e 202), o art. 9º da Lei 8.213/91 disciplina que os planos de benefício de previdência social compreendem o Regime Geral de Previdência Social, disciplinado pela referida lei e operacionalizado pelo INSS; e o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social, que seria objeto de lei específica, para o qual foi editada a Lei Complementar 109/01.
Esse Regime Facultativo Complementar de Previdência tem por finalidade de proporcionar proteção previdenciária adicional ao trabalhador, apoiado em regime financeiro necessariamente de capitalização, pois o próprio segurado contribui para os benefícios a serem percebidos por ele (art. 202, CF). Ele é operado por Entidades Abertas de Previdência Complementar (EAPC), inseridas no mercado financeiro aqui tratado, e por Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), inseridas no mercado financeiro tratado na postagem seguinte.
Na forma da Lei Complementar 109/01, as EAPC são constituídas sob a forma de sociedades anônimas, com fins lucrativos e possuem objeto social a instituição e operacionalização de benefícios de caráter previdenciário, concedidos em forma de renda continuada (benefício de prestação continuada) ou pagamento único, acessíveis a quaisquer pessoas físicas, independente de vínculo profissional ou associativo (art. 36).
A normatização, coordenação, supervisão, fiscalização e controle das atividades das entidades de previdência complementar serão realizados por órgão ou órgãos regulador e fiscalizador (art. 5º, LC 109/01). Até que seja criado um órgão específico para isso, as funções do órgão regulador e do órgão fiscalizador serão exercidas por CNSP e SUSEP, em relação, respectivamente, à regulação e fiscalização das entidades abertas (art. 74).
Essas EAPC são fiscalizadas pela SUSEP (arts. 29 e 37), dependem desse órgão fiscalizador a autorização para seu funcionamento (art. 38) e operam os planos de benefícios de entidades abertas descritos no art. 26 e ss da Lei Complementar 109/01.
Os principais produtos de previdência complementar aberta no país são o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) e o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL).
- Link: https://investigacaofinanceira.com.br/siga-o-dinheiro/
- Link: https://investigacaofinanceira.com.br/mercados-financeiros-i/
- Link: https://investigacaofinanceira.com.br/mercados-financeiros-ii-credito/
- Link: https://investigacaofinanceira.com.br/mercados-financeiros-iii-cambio/
- Link: https://investigacaofinanceira.com.br/mercados-financeiros-iii-capitais/
- São obrigatórios, além de outros previstos em leis especiais: o seguro de danos pessoais a passageiros de aeronaves comerciais; o seguro de responsabilidade civil do proprietário de aeronaves e do transporte aéreo; o seguro de responsabilidade civil do construtor de imóveis em zonas urbanas por danos a pessoas ou coisas; o seguro de garantia de cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis; seguro de garantia do pagamento a cargo de mutuário da construção civil, inclusive obrigação imobiliária; o seguro de edifícios divididos em unidades autônomas; o seguro de incêndio e transporte de bens pertencentes a pessoas jurídicas; o seguro de crédito à exportação, quando julgado conveniente pelo CNSP; o seguro de danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e por embarcações, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não; e o seguro de responsabilidade civil dos transportadores terrestres, marítimos, fluviais e lacustres, por danos à carga transportada. Esses seguros obrigatórios previstos no artigo 20 do Decreto-lei 73/66 foram, em parte, regulados pelo Decreto 61.867/67. Em outros casos, o seguro foi regulado por lei especial, como o seguro obrigatório de danos por embarcações (Lei 8.374/91).
- Também atuam no mercado os corretores de seguro, definidos como a pessoa física ou jurídica que serve como intermediário legalmente autorizado a angariar e promover contratos de seguro entre sociedades seguradoras e clientes (art. 122, Decreto-Lei n. 73/66), recebendo uma comissão de corretagem. O corretor depende de prévia habilitação e registro pelas entidades autorreguladoras de corretagem de seguros ou pela SUSEP, na forma definida pelo CNSP.